O Canhão da Nazaré ou Cana da Nazaré é um vale profundo que se estende,
em forma de V, numa extensão de 200 km, na direção Este-Oeste, atingindo uma
profundidade máxima superior a 5000
metros, na zona mais afastada da costa, e uma profundidade mínima de 50 metros,
próximo da costa – a cerca de 500 metros dela.
Dada a sua enorme profundidade, o Canhão é riquíssimo em
fauna e flora, bem como em nutrientes diversos que nele se desenvolvem e
permanecem. Os pescadores da Nazaré, mesmo os mais antigos, sempre souberam da
existência do Canhão, visto que para colocarem os seus aparelhos de pesca,
tinham que sondar os fundos e facilmente definiram as zonas limites do Canhão.
Até há cerca de 50 anos atrás, quando não havia ainda as Sondas Eletrónicas e
os aparelhos de GPS, a sondagem dos
fundos era feita manualmente com um peso
de chumbo ensebado, colocado na extremidade de um cabo, que largavam até
encontrar o fundo – rocha ou areia. Se fosse areia, vinha areia agarrada ao
sebo; se fosse rocha, ficava uma marca no chumbo e não vinha areia agarrada.
Geralmente, procuravam a rocha, onde se esconde normalmente a maioria dos peixes.
Ao fazerem estas sondagens diárias, foram construindo um mapa de todos os
pesqueiros ao largo da costa. Quando chegavam à zona do Canhão, a sonda nunca
encontrava fundo, pois o cabo que utilizavam não tinha comprimento suficiente,
nem lhes interessava esses fundos tão grandes. E foi assim que foram definindo
os limites do Canhão.
Na Nazaré, sempre se soube que as ondas na Praia de Norte eram maiores do que o habitual em
qualquer lado e que tinham a direção definida pela orientação do Canhão. Os
pescadores também sabiam que, em dias de mar levadio, tinham que passar bem ao
largo da zona de formação dessas ondas. Por isso, os nazarenos habituaram-se a
conviver com essa realidade, e já pouca atenção lhes despertava, fazendo parte
já do cenário circundante, em dias de outono e inverno.
A novidade aqui foi a circunstância de um americano
destemido, quiçá meio-louco – Garrett McNamara - (link do Facebook) ter decidido surfar uma dessas ondas gigantes que aqui se formam e alguém ter fotografado a onda surfada e
publicitá-la na internet. O resto, a imprensa internacional e os utilizadores
da internet e redes sociais encarregaram-se de espalhar o acontecimento pelos 4
cantos do mundo. Foi o que se chama uma Publicidade Grátis da Nazaré, por todo
o mundo.
A Câmara Municipal da Nazaré e a empresa camarária Nazaré Qualifica decidiram desde logo, e bem, aproveitar a oportunidade para
rentabilizar o evento, estabelecendo protocolos com Garret McNamara e a
empresa Zon, criando o evento Zon North Canyon Show (e no Facebook) que consiste na exibição de Garrett McNamara e alguns convidados,
surfando as ondas gigantes na Nazaré, durante o período de Novembro a Janeiro.
O comércio local já tem recolhido alguns dividendos com esta promoção especial,
mas muito há ainda a fazer!
A partir daí, muita gente decidiu que um dia viria à Nazaré,
uns para verem esse local fantástico, outros para surfarem no local.
Mas porque é que as ondas neste local são tão grandes?
A razão principal para as
ondas formadas poderem atingir 30 a 40 metros de crista tem a ver com o facto
de o Canhão
funcionar como uma rampa que vem a subir na direção da costa, em forma de
funil, projetando as águas em movimento para cima, atingindo cristas mais
elevadas do que o normal. Claro que estas ondas não acontecem todos os dias.
Têm que ser reunidas condições meteorológicas e de mar particulares: direção do
vento, das correntes marítimas, agitação marítima, as quais ocorrem nos
períodos de Outono e Inverno, entre Novembro e Janeiro.
No Verão, o Canhão pode parecer um cordeiro e, no
inverno, um leão enfurecido.
O meu pai, Zé da Palacida,
hoje com 87 anos de idade, foi pescador da lagosta (com covos) e da pesca com
groseira (com anzóis), de peixes
variados, nos mares da Nazaré, e contou-me muitos episódios passados no mar da
Nazaré e alguns deles perto do Canhão, onde perdiam alguns apetrechos de pesca,
por mais cuidado que tivessem. No livro ‘A Biografia de Zé da Palacida –
Pescador na Praia da Nazaré’ são relatados alguns
episódios de pesca ao largo da Nazaré, alguns deles envolvendo o Canhão. O
Canhão era, até aparecerem as Sondas Eletrónicas e os equipamentos de GPS, como
um abismo enorme, cheio de mistérios insondáveis.
É no Canhão que, por
exemplo, foi abandonado um submarino da marinha alemã, no fim da 2ª Grande
Guerra, em 1945, pelos seus militares que se renderam às autoridades nazarenas
da época. Esse tema é relatado pela imprensa local, e nacional, da época. O
imaginário nazareno admite que muitos outros segredos ele guardará.
Quem sabe se não poderemos
um dia dar um passeio de barco-submarino e explorar os mistérios que ele tão
bem tem guardado!
Nazaré,
20 de Agosto de 2013
José
Vagos Carreira Matias
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